Medos e Limites: Caso Leodis McKelvin


Restava menos de dois minutos para o término da partida entre New England Patriots e Buffalo Bills. A equipe de Buffalo estava na frente (24 a 19) e prestes a receber um kickoff dos Patriots. Leodis McKelvin, cornerback, recebe a bola dentro da endzone e tinha duas opções: forçar um touchback ajoelhando onde estava para seu time começar o ataque a partir da jarda de número 20, ou correr buscando avançar mais no campo. Ele optou pela segunda alternativa, pois ele é um especialista em retornar kickoffs – o segundo em toda a NFL no ano passado com 1468 jardas. Ninguém esperava que o lance retratado na foto acima acontecesse.

Quando McKelvin chegou perto da jarda de número 30, ele recebeu vários tackles e deixou a bola cair. Os Patriots recuperaram e marcaram o touchdown (TD) da vitória nos minutos finas do jogo. A reação de todos que estavam assistindo, seja torcedor do Bills ou não, foi de espanto; exatamente o mais difícil aconteceu.

Ao voltar para sua residência – que fica na cidade de Hamburg, perto de Buffalo, estado de New York – ele se depara com um ato de vandalismo. No jardim em frente da casa está escrito o placar do jogo e um desenho obsceno “ensinando a ele como ajoelhar”... Ver aquilo causou uma sensação de medo. Até então ninguém sabia quem era o autor da barbaridade e nem se tinha feito algo com a casa.

A polícia conseguiu achar os infelizes desocupados que fizeram a agressão: dois adolescentes de 16 anos que confirmaram a ação. Na Quarta (dia 16), McKelvin (foto à esq.) disse ao Sgt. Thomas Best, da delegacia de Hamburg, que não iria registrar acusação contra os garotos, não querendo levar eles à prisão pelo ato ocorrido. Porém nesta Quinta (17), o advogado do distrito de Eric County, área de Buffalo, disse em entrevista a uma rádio local (WBEN) que recebeu uma declaração juramentada de McKelvin afirmando que o jogador gostaria de incriminar os garotos – talvez Leodis soube que a punição será leve se vier a ser concretizada. O objetivo do atleta é ao menos punir os infratores, mesmo que sejam algumas horas de serviços comunitários, aproveitando para não deixar um cheiro de impunidade no ar.

Este episódio trouxe de volta a questão da segurança dos jogadores da NFL. Todos vivem com bastante medo e receio desde a morte do Sean Taylor, jogador do Washington Redskins, em 2007. “Nós, atletas da NFL, sempre pensamos no pior desde o incidente com Taylor. As pessoas chegam à sua casa com alguma coisa e é preciso manter a atenção” diz McKelvin sobre a sensação que os jogadores da liga têm hoje. Os garotos foram até a residência de Leodis com um spray, mas eles poderiam estar com outros objetos...

Entre os atletas da NFL há várias histórias de medo e situações que pessoas passaram do limite. Eis algumas delas:

BEN ROETHLISBERGER, quarterback do Pittsburgh Steelers. No começo ele era alvo de olhares julgadores e de comentários provocantes. Seus companheiros diziam: Quem é este “novato” para andar com este monte de guarda-costas? “Big Ben” ri deste tempo quando olha para as mesmas pessoas que lhe criticavam e hoje estão com seguranças também... “Ter um guarda-costas não é sinônimo de fraqueza. Tenho plena certeza que 99% dos jogadores da NFL podem encarar uma luta ‘mano a mano’. A questão, porém não é só nos proteger mas também outras coisas como a nossa reputação, nossa saúde, família, dinheiro... Estamos tentando salvar as nossas vidas.” afirma o QB.

KEVIN MAWAE, center do Tennesee Titans e presidente do sindicato dos atletas da NFL. Ele contou uma história pessoal interessante à ESPN. “Isto aconteceu em 2006 quando comecei a morar em Tennessee. Eu estava no CT e minha mulher e meus filhos em casa. Ela recebeu um telefonema de um vizinho dizendo que a van estacionada na frente da nossa casa estava lá por três dias, com um cara olhando para a residência usando um binóculo. Então, eu liguei para a segurança da NFL e eles conseguiram a placa da van, descobriram quem era o cara e o pegaram no mercadinho do bairro. O ‘espião’ era um simpático senhor de idade que queria apenas me ver e pegar um autógrafo. Esse é um exemplo clássico do limite ultrapassado: Nunca se sabe o que pode acontecer”.

FRED TAYLOR, running back do New England Patriots. Por “não saber o que pode acontecer”, Fred toma uma decisão mais drástica, conhecida como AK-47, pistola automática... Ele tem licença para usar armas e as carrega com frequência, mesmo a NFL não permitindo elas em alguns lugares, principalmente nas sedes dos clubes e em estádios. “Quem sabe o que é suficiente? Tudo o que você imaginar de dispositivo de segurança eu tenho instalado na minha casa. Posso monitorar tudo no meu laptop. Mesmo assim não me sinto totalmente seguro”.



RYAN STEWART, ex-safety do Detroit Lions. Esta é uma história quase trágica. Ele estudou na escola de ensino médio Berkeley High School na Carolina do Sul e participou de uma das grandes rivalidades do estado. Em um jogo com seu time perdendo para o grande rival por 5 pontos e o relógio já zerado, ele retornou um kickoff – pegando a bola na endzone – e por pouco não marcou o TD da vitória; faltou 11 jardas. Ao voltar para casa, um carro estava o seguindo (Stewart dirigia uma pick-up no estilo off-road). Em um determinado ponto, alguém sai do carro de trás e atira contra Ryan. A bala atravessa a caçamba, a cabine dupla e para na parte traseira do banco do motorista... Stewart nada sofreu.

Apesar de parecer óbvio, muitos fãs não sabem quando ultrapassam o limite entre ser “um-idiota-sem-ter-o-que-fazer” ou apenas um torcedor indignado. O que aconteceu com McKelvin foi surpreendente porque os torcedores dos Bills são conhecidos em toda a NFL por apoiar incondicionalmente os jogadores do clube e respeitar a privacidade deles. É claro que a ação de dois meliantes não expressa o sentimento de toda a torcida. No jogo deste domingo em casa contra o Tampa Bay Buccaneers, irá ser a oportunidade de eles fazerem algo semelhante ao que foi feito com Scott Norwood.

Norwood é conhecido simplesmente por perder o field goal mais importante da franquia - caso fosse convertido daria o título do Super Bowl XXV (1991) aos Bills contra o New York Giants. Até hoje ele é chamado de Wide Right (tr. Pra Fora à Direita) e foi satirizado em programas, seriados, músicas... Porém quando ele chegou em Buffalo após a decisão, 25 mil fãs gritaram “Nós amamos Scott” e o ovacionaram mais do que a estrela do time, o QB Jim Kelly.

A agência de notícias Associated Press foi às ruas de Buffalo ver o real sentimento do verdadeiro torcedor do clube. Encontraram o bom senso ao entrevistar um sócio-torcedor (Harry Kozlowski). “Eu sugiro que nós fãs assinemos um cartão gigante pedindo desculpas a McKelvin. O que aconteceu com ele é lamentável porque rotulou todos os torcedores dos Bills. Os fãs de football esquecem que os jogadores são seres humanos e ir para o jardim de um atleta e cometer um ato de vandalismo não vai ajudá-lo a jogar melhor... Mostrar apoio e incentivo fará maravilhas para ele superar o fato de ter decepcionado seus companheiros”.

(GL)



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