Será o fim dos abusos cometidos por times da NFL contra suas cheerleaders?


Na semana do draft, um dos eventos mais importantes no calendário da NFL, a liga sofreu mais um golpe que sozinho não é capaz de tonteá-la, mas junto com os outros três recebidos ao longo deste ano pode deixar marcas na organização tida como uma das mais exemplares no mundo esportivo.

Quem ataca são as cheerleaders, expondo abusos graves e vergonhosos que franquias impõe em cada uma delas. É um assunto que hora ou outra ventilava, ganhava destaques em sites/blogs, porém logo desparecia. A diferença é que agora são processos judiciais a arma usada pelas moças para conseguir o básico de direitos e respeito, nada mais.

De janeiro até maio, foram quatro processos protocolados contra times da NFL, todos acusando os dirigentes de não praticarem a mínima legislação trabalhista. Quem iniciou a onda foi Lacy T., ex- cheerleader do Oakland Raiders, que pôs sua luta contra as Raiderettes na Justiça em janeiro; no mês seguinte, foi a vez de Alexa Brenneman, ex-cheerleader do Cincinnatti Bengals; no mês passado, cinco ex- cheerleaders do Buffalo Bills assumiram a batalha nos tribunais. E, no último dia 06, Krystal C., ex- cheerleader do New York Jets, engrossou a lista processual que a NFL precisa ficar de olho para não permitir uma mancha em sua imagem.

Todos os casos têm em comum uma coisa: salário abaixo do mínimo estipulado por lei.

As integrantes da Flight Crew, equipe de cheerleaders dos Jets, recebem por jogo US$ 150 e US$ 100 dólares por eventos extras. Porém, somando todos os vencimentos e despesas obrigatórias que têm com a própria função, o salário por hora trabalhada é US$ 1,50, bem menor do que o salário mínimo do estado de New York: US$ 7,25.

Krystal C. decidiu entrar na briga pelo necessário, não exigindo luxo. Contudo, até no mundo das cheerleaders há corporativismo, pois companheiras que estão na mesma situação dela decidiram não participar do processo, se mostrando coniventes com a situação de trabalho precária. Fora isso, ela, assim como as outras que optaram por colocar a cara a tapa, sofrem ameaças e intimidações de cheerleaders veteranas.

Além dos vencimentos irrisórios, tem a questão do abuso moral cometido pelas equipes de cheerleaders. Algumas são contratadas como “parceiras independentes “, mas muitas, como a Flight Crew, as cheerleaders são consideradas empregadas dos clubes. Essa associação direta é que deveria preocupar a NFL e fazer com que a diretoria da liga se antecipe a uma crise e resolva a situação.

Isso porque se tudo o que acontece com as cheerleaders for vazado para a imprensa, será potencialmente trágico. O caso mais grave acontece com as Buffalo Jills, cheerleaders do Buffalo Bills. A cartilha comportamental entregue a elas na temporada passada foi divulgada na mídia, praticamente em conjunto com o processo, protocolado no final de abril. As cheerleaders também recebiam menos que o mínimo estadual – a cidade de Buffalo está no estado de New York, mas o que chama mais a atenção são as exigências impostas às garotas, desde como se comportar corretamente em um jantar até sobre não paquerar. Regras mandavam que não conversassem sobre política, religião e fofocas. Eram encorajadas a não ter “opiniões fortes, polêmicas” acerca de qualquer tema. Chagava ao ponto de determinar como deveria ser a higiene íntima das moças (menstruação e depilação).

Esse caso envolvendo a Buffalo Jills é tão grave que os Bills suspenderam as atividades da equipe e não se sabe ao certo se na estreia do time em casa na temporada 2014-15 haverá cheerleaders na linha lateral de campo.

O que sofre os Bills é similar ao que acontece com as cheerleaders do Baltimore Ravens em 2009. Uma cartilha cheia de demandas absurda foi espalhada na internet, mas nada se fez na época. A discussão agora atingindo o campo judicial, não será surpresa se outras cartilhas aparecerem.

Com as Ben-Gals (Cincinnati Benglas) e Raiderettes, por enquanto o que se discute são salários. As cheerleaders dos Bengals recebem US$ 90/jogo, US$ 2,85/hora na temporada passada. O piso salarial no estado de Ohio é US$ 7,85/hora.

As Raiderettes, em 2013, receberam menos de US$ 5/hora, sendo que o salário mínimo na California é US$ 8/hora.

Obrigadas a ir em viagens, eventos filantrópicos, e custear o salão de beleza e uniformes, as cheerleaders de clubes da NFL estão a caminho de revolucionar um setor da liga que é destaque pela beleza e atração, mas tem um submundo cruel e desumano. Muitos fãs demonstram desinteresse para com elas, reforçando que a participação nos jogos é irrelevante e que atraem pouca receita para a franquia. Independente disso, a partir do momento que um time da NFL se compromete a montar uma equipe de cheerleaders, o mínimo a elas tem de ser dado – principalmente em questões trabalhistas.

Há o glamour? Sim, mas poucas desfrutam disso. A equipe de cheerleaders mais famosa da NFL, do Dallas Cowboys, está num patamar diferenciado e pode ser considerada a única que tem uma estrutura sólida e diferente – apesar de que cada uma delas não recebem muito: US$ 150/jogo. Leia "Dallas Cowboys ganha uma fortuna com suas cheerleaders. Elas se preocupam mais com a fama do que com o salário" e saiba mais sobre as DCC.

Se considerado um esporte, cheerleading seria o que causa mais lesões em todo os Estados Unidos. Quem é praticante desconsidera o que as moças da NFL fazem como cheerleading, Seja como for, elas também não devem estar ali de graça, ou pagando para ser vestir uma roupa curta, sensual e dançar para +80 mil pessoas.

Em cinco meses são quatro processos. A NFL tem de se posicionar para impedir que esse número cresça e tentar impedir o sangramento de futuras informações que possam surgir contra as equipes de cheerleaders das franquias. Agindo com força nos bastidores, a NFL pode fazer valer o ditado “há males que vem para o bem” e transformar a onda de processos em algo bom.

A NFL dá uma atenção especial a mulher, por mais que as ações no Outubro Rosa (campanha contra o câncer de mama) tenha interesse comercial. A liga busca lucro e não seria ruim ganhar uma grana se criasse um plano de atividade especial para as cheerleaders, elaborando um sistema padrão que cumprisse determinações básicas de trabalho. Adicionando uma valorização no status, dando a elas um sentimento de fazer parte da engrenagem rica que é a NFL, a liga pode vender que está fazendo alguma coisa para coibir abusos e melhorar as condições das cheerleaders.

Seria uma bela ação de marketing, combinada com uma propaganda institucional de primeira linha.

(GL)
Escrito por João da Paz