Outro Reinado, Outras Leis


Que Michael Jordan é o melhor jogador que o basquete já teve em toda a sua história é inegável. Fora isso, ele é um ícone que simboliza o ressurgimento da NBA na década de 90, se tornando um nome conhecido nos quatro cantos da Terra. Sua forte personalidade cria uma aura de semi-deus, uma personificação de alguém feito exclusivamente para viver pelo e para o esporte.

Como era de se esperar, Jordan, assim que se aposentou, entrou no mundo diretor da associação. Nesta semana, entretanto, ele está prestes a avançar e dar um passo importantíssimo quando David Stern (comissário da NBA), com a aprovação de 31 donos de franquias da liga, deverá anunciar Michael como o mais novo proprietário do Charlotte Bobcats.

Este é um avanço notável, pois ele será o primeiro ex-jogador da NBA a possuir um clube na associação e o segundo afro-americano a chegar neste posto – o pioneiro nesta posição foi Robert Johnson, criador da franquia Bobcats. Jordan e Johnson são parceiros desde 2006, quando Michael assumiu o cargo de Gerente das Operações de Basquete e sócio minoritário. O período dedicado aos Bobcats soma-se como experiência aos anos de diretor no Washington Wizards (2000-03), lhe mostrando que no alto escalão as coisas funcionam de outra maneira.

Por mais que ele seja Jordan e está comandando um clube do estado (Carolina do Norte) que o projetou para o esporte, se ele não conseguir tornar a franquia rentável e competitiva, sofrerá uma pressão e cobranças sem precedentes. Na verdade nem tanto assim, porque suas decisões com os Wizards e os Bobcats foram criticadas veementemente pela mídia e torcedores – embora o que podia ser algo para desmotivar, só incentiva mais Jordan a seguir em frente, já que ele não se esquece facilmente e usas as avaliações negativas como combustível para responder tais argumentações.

O “caso Kwame Brown”, por exemplo. A escolha dele como o número 1 do draft de 2001 pelo Wizards é lembrada até hoje, isto porque o jogador que veio direto do high school (ensino médio) nem de longe correspondeu as altas expectativas. Jordan apostou no garoto e não deu certo, mas quem ele escolheria? Tyson Chandler? Eddy Curry? Esses três caras eram as altas apostas do draft daquele ano (todos vindo do HS) e Brown era o jogador que os times mais queriam. Jordan não costuma fazer isto, mas seguiu a opinião que na época era a mais popular.


Ainda aconteceram outros controvérsias: a troca de Richard Hamilton por Jerry Stackhouse (Wizards), a escolha de Adam Morrison no draft de 2006 (Bobcats)... Equívocos que Michael sabe que cometeu e servirão como uma mola impulsionadora para fazer decisões mais sábias e se colocar cara a cara com torcedores e mídia, mostrando que ele tem capacidade de ser um dono que colocará um time vencedor em quadra.

A gana de vencer e competir sempre estiveram no DNA de Jordan e isto ele deixou claro no seu discurso ao entrar no Hall da Fama do basquete em 2009, relembrando vivamente situações que marcaram sua carreira, principalmente aquelas nas quais ele foi alvo de críticas, agradecendo ironicamente os que duvidaram da sua capacidade.

Ele lembrou um episódio envolvendo um jogador chamado Leon Smith, escolhido no seu lugar no time titular da universidade (North Carolina Tar Heels) em seu primeiro ano por lá; fez questão de mostrar em quadra que a vaga pertencia a ele. Lembrou de uma reportagem antiga da revista Sports Illustraded que divulgou uma declaração do seu treinador nos Tar Heels (Dean Smith) que nomeava os titulares como sendo fundamentais para o sucesso da equipe, só esqueceu de mencionar o então novato Jordan; fez questão de mostrar em quadra que ele tinha valor. Lembrou de uma conversa com Byron Russel que ocorreu em um campo de golfe em 1994 e o ala do Utah Jazz disse: “Porque você se aposentou? Você sabe que se eu te encontrar de shorts e regata eu posso te marcar, sabe?”; fez questão de lembrar Russel desta declaração quando se encontraram novamente em quadra no ano de 1996 e Jordan disse ”Eis agora sua chance”.

Não é necessário duvidar, pois ele tem em mente o que as pessoas dizem sobre suas péssimas decisões enquanto gerente e ele irá trazê-las à tona quando o momento for propício. Quando ele conseguir atingir o sucesso dirá: “Lembra daquele tempo quando diziam blá blá blá sobre Brown e Morrison...


O desafio é grande, apesar de Jordan gostar assim. Ele pega uma franquia com dívidas em torno de US$ 150 milhões, uma base de fãs rasa e um clube que nunca avançou para os playoffs desde sua fundação (2004). Uma reformulação está por vir; o que não é uma das opções: é a única opção.

Nada será simples e Michael precisa ser consciente da sua nova responsabilidade. A franquia, em suma, irá refletir o dono, seu comportamento, suas atitudes, suas decisões. Ele terá que agir de forma inteligente e ágil, disposto a fazer de tudo para reposicionar uma cidade apaixonada por basquete na elite novamente. Nos anos 90 (com os Hornets) Charlotte teve a melhor média de público durante várias temporadas; hoje (campeonato 2009-10) os Bobcats estão na 23ª posição em público. Muitas ações precisam ser feitas para mudar este quadro e entre elas tem uma que é primordial: um time vitorioso.

Parece que este será o campeonato que Charlotte irá pela primeira vez aos playoffs e vale ressaltar que uma das movimentações feitas nesta temporada – a contratação de Stephen Jackson – teve o aval de Jordan. Disputar os playoffs nos primeiros instantes após assumir o controle da franquia, será um sinal de que coisas boas tendem acontecer num futuro próximo.

Michael Jordan existe para superar barreiras e vencer desafios. Não é qualquer pessoa que tem a coragem de entrar com um pequeno patrimônio (em volta dos US$ 400 milhões) e encarar os bilionários donos de franquias da NBA. Talvez isto venha a ser mais um ponto favorável para ele, pois se concentrará exclusivamente na administração do clube, cuidando das rotinas diárias da franquia com mais paixão e profissionalismo. Isto será fundamental para que a magia que circula o mito se transfira para os bastidores e lhe ajude a sair vitorioso nesta nova empreitada, ciente de que “jogar com uma caneta na mão” são outros 500.



(GL)


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