Patriotismo sim, até a página 3


O jogador Nenê, pivô do Denver Nuggets, recusou a convocação da seleção brasileira que jogará o pré-olímpico na Argentina a partir do próximo 30 de Agosto. A dispensa gerou diversos comentários e, em entrevista ao blog Balanacesta (do Fábio Balassiano), a maior referência do basquete brasileiro deu sua opinião sobre.

Oscar Schmidt, ao ser perguntado “O que achou da atitude do atleta?” Respondeu assim:

Achei deplorável. Se Manu Ginóbili (ala da Argentina e campeão olímpico), Dirk Nowitzki (ala-pivô da Alemanha que acaba de se sagrar campeão da NBA) e Kobe Bryant (ala-armador norte-americano considerado um dos melhores de todos os tempos), craques consagrados, jogam por suas seleções com gosto, não justifica, de maneira alguma, que os nossos atletas fiquem de fora.”

Tudo muito bonito. Porém há ressalvas.

Veja o exemplo de Kobe Bryant.

Kobe fez parte do “Time do Resgate”, equipe que ganhou o ouro na Olimpíada de Pequim em 2008 (foto acima). O rótulo do elenco retrata o significado da conquista. O jogador dos Lakers está na NBA desde 1996 e seu primeiro jogo pelo selecionado americano foi em 2007. Por quê?

Ao final da temporada que lhe deu seu primeiro título da associação, 1999-2000, Kobe foi convocado para atuar nos jogos olímpicos em Sydney. Não quis ir. Deu sua explicação ao jornal The New York Times três meses antes da competição afirmando o seguinte: “Eu estou me inclinando para não ir. Há muita coisa que quero fazer neste verão (férias). Passar tempo com minha família, casar, relaxar.”

Hum!

Para o mundial de 2002 nos EUA (cidade de Indianápolis) ele pediu dispensa. Mesmo assim estava incluído nos planos das três competições futuras: Pré-Olímpico (2003), Olimpíada (2004) e Mundial (2006). Devido cirurgias, não participou do Pré-Olímpico, na ocasião Vince Carter foi convocado no lugar, mas a vaga de Kobe estava garantida para os Jogos em Atenas. Não defendeu os EUA na Grécia e nem no Mundial do Japão.

Desde 1992, quando os jogadores da NBA tiveram permissão para participar das Olimpíadas (e desde 1994 dos Mundiais), a seleção americana teve dois períodos extremos de auge: o Dream Team nos Jogos de Barcelona (’92) e o Redeem Team nos Jogos em Pequim (’08). Entre um ponto e outro houve uma parábola de barriga pra baixo que expõe o desempenho da seleção nas competições e o envolvimento dos jogadores da NBA. Do sonho à remissão, muita coisa aconteceu.

Mundial de 1994 em Toronto, Canadá (EUA campeão)


A primeira colocação veio fácil. O time não tinha jogadores da Olimpíada de Barcelona e era composto por caras novas – observando a qualidade e o alto nível de jogo. Shaquille O’Neal, Dominique Wilikins, Reggie Miller e Joe Dumars faziam parte do grupo.

Olimpíada de 1996 em Atlanta, Estados Unidos (EUA Medalha de Ouro)

Foi mais um time forte e a torcida local gostou de ver. Cinco membros do Dream Team estavam neste time (Charles Barkley, Karl Malone, Scottie Pippen, David Robinson e John Stockton). O’Neal também marcou presença e esta foi sua última participação pela seleção. Sua não inclusão nos times seguintes merece destaque.

Shaq não gostou de ser colocado de fora do Pré-Olímpico de 1999, achou falta de respeito. Pegou birra, fechou a cara e disse à revista Sports Illustraded na época: “Provavelmente eu não vou [jogar as Olimpíadas de Sydney]. Eles podem achar outra pessoa”. Depois ele usou seu denso humor para explicar sua não ida para os Jogos de 2000: “Tenho duas medalhas de ouro, é o bastante”. Recusou ir para o Mundial de 2002, Olimpíada de 2004 e para o grupo do Mundial 2006 e Olimpíada 2008.

Mundial de 1998 em Atenas, Grécia (EUA 3º lugar)

O time dos Estados Unidos foi horrível e até poderia ser excluído desta lista. A NBA passava por um lockout e nenhum jogador da associação estava autorizado para participar. O grupo formado de atletas de quinta categoria até que conseguiu uma boa campanha e saiu da competição no pódio. Do time só dois jogadores conseguiram progredir: Brad Miller, que faz uma boa carreira na NBA e Trajan Langdon, um dos melhores americanos que jogou no circuito europeu (MVP do Final Four da Euroliga em 2008 e parte integrante do time ideal da Euroliga da década ’01-’10).

Olimpíada de 2000 em Sydney, Austrália (EUA Medalha de Ouro)

A campanha deste time foi uma das mais fracas, mesmo com a invencibilidade no torneio. A mística dos jogadores da NBA estava acabando e criou-se a sensação de que a derrota estava próxima. Dos três times ideais da temporada 1999-00 (15 jogadores no total, todos americanos), só 5 foram para os Jogos: Kevin Garnett, Gary Payton e Jason Kidd (1º Time); Alonzo Mourning (2º Time) e Vince Carter (3º Time).

Mundial de 2002 em Indianápolis, Estados Unidos (EUA 6º lugar)

No solo americano ocorreu a primeira derrota de um time formado por jogadores da NBA: contra a Argentina, vice-campeã do torneio. O interesse do público local era pouco e só 5.623 pessoas compareceram no ginásio para assistir o jogo. Mesmo em casa, muitos atletas da NBA recusaram servir a seleção, entre eles estrelas do momento como Tim Duncan, Kevin Garnett, Kobe Bryant, Tracy McGrady e Michael Jordan. Outros dois grandes nomes iriam participar, mas foram cortados por sofrerem lesões: Ray Allen e Jason Kidd. No elenco não tinha nenhum jogador do 1º ou 2º time ideal da temporada 2001-02, porém havia três do 3º time (Ben Wallace, Paul Pierce e Jermaine O’Neal). O apelido deste grupo era “Time da Soneca”, colocado por membros da imprensa.

Olimpíada de 2004 em Atenas, Grécia (EUA 3º lugar)

O elenco dos Jogos em Atenas ganhou um apelido mais forte: “Time do Pesadelo”. Apesar de contar com dois MVP’s (Tim Duncan e Allen Iverson), o time sofreu uma desintegração total em comparação àquele que conseguiu a vaga no Pré-Olímpico em 2003. Nove jogadores dos 12 convocados inicialmente pediram dispensa (Tracy McGrady, Jason Kidd, Karl Malone, Ray Allen, Vince Carter, Elton Brand, Nick Collinson, Kenyon Martin e Mike Bibby) – sem contar as desistências de Shaq e Garnett. Então o treinador Larry Brown teve que incluir na lista os novatos LeBron James, Dwyane Wade e Carmelo Anthony – atuaram pouco.

Mundial de 2006 em Saitama, Japão (EUA 3º lugar)

A comissão técnica formada mudou o conceito e exigiu lealdade dos atletas para as três competições principais que viriam pela frente: Mundial, Pré-Olímpico e Olimpíada. Uma das exceções foi dada a Kobe que só não jogou o Mundial. No Japão os capitães foram Wade, LeBron e Carmelo e os três, junto com Chris Bosh, Dwight Howard e Chris Paul, foram membros do grupo de 2008 conhecido por “Redeem Team”.

Uma peça chave neste período foi o armador Chauncey Billups do New York Knicks. É dele a outra exceção. Parte integrante do time no Pré-Olimpico de 2007, Billups não viajou à China no ano seguinte por motivos pessoais – a esposa dele estava esperando um filho. Porém esteve presente na equipe de 2010.


O projeto de três anos (2010-12) continua e 27 jogadores fazem parte dele. No Mundial do ano passado o treinador Mike Krzyzewski optou por excluir os jogadores do “Redeem Team”, mas os selecionados conseguiram o título em Istambul, Turquia (foto acima). Membros desses dois grupos formarão o elenco para os Jogos em Londres no ano que vem. Por serem os atuais campeões mundiais, a seleção americana não precisa participar do Pré-Olímpico, mas o diretor da federação USA Basketball, Jerry Colangelo, pretende reunir o máximo de jogadores possíveis neste meio de ano para criar e aumentar o entrosamento entre eles.

Quando há harmonia e um propósito único de ser vencedor, comprometimento que vem de todas as partes envolvidas, fica fácil ser “fiel ao país”.



(GL)
Escrito por João da Paz

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