A vontade e o querer de Alex Smith

Quem não quer conquistar algo? Ser o melhor no que faz?

Caso sua resposta seja “eu não” para ambas as questões, lamento. Ou você está mentindo ou está pregando um falso moralismo que só vai te prejudicar. Almejar ser bom, ter ambição em atingir lugares altos só ajuda, não atrapalha.

Muitos confundem uma atitude do tipo e dizem partir de gente “arrogante”. Mas a busca para ser o melhor na área da qual é especialista levará a pessoa a um lugar mais aprazível do que estava antes. Pode não ser o topo, porém estará numa posição mais avançada. O desejo de chegar a uma condição mais superior deve estar intrínseco em cada indivíduo.

Isso vale para quem inicia a jornada num ponto mais baixo. E se a caminhada da vida profissional começar no topo? Como se comportar?

Merecido? Pode se discutir. Mas o fato é que Alex Smith, quarterback do San Francisco 49ers, foi escolhido na primeira posição do draft da NFL em 2005. Esta classe entregou à liga jogadores de qualidade (27 atletas que participaram de Jogo das Estrelas – Pro Bowl). Contudo a pressão maior está no número 1.

Smith começou sua carreira profissional no banco, mas após 5 rodadas virou titular. Trazia uma boa bagagem da NCAA quando comandou o ataque da Universidade Utah, então treinada por Urban Meyer (atualmente técnico da Ohio State e duas vezes campeão universitário com a Florida Gators). Smith sentia a cobrança que exerciam sobre ele e esta preocupação foi demonstrada dentro de campo. Era como se a cada passe e a cada jogada fosse necessário mostrar porque foi escolhido na frente de 254 outros jogadores, porque foi o número 1.

Eram passes forçados tentando completá-los para que alguém dissesse: “Nossa, este é um lançamento pro”, ou “O cara é mesmo um QB da NFL”. Smith tentava impressionar os outros e esquecia-se de fazer o seu, o básico. Os lances que queria realizar eram os mais complexos para deixar uma boa impressão. Não queria que a seguinte questão surgisse: “Será que Alex Smith é realmente um QB número 1?”.

Se a primeira impressão é a que fica, a temporada de novato de Smith teve estes números: 1 TD, 11 INT’s, 9 fumbles... Em 2006, com exceção da atual temporada, foi o único campeonato que o QB jogou as 16 partidas do calendário. Não apresentou números satisfatórios: 16 TD’s, 16 INT’s... Jogou apenas 7 partidas em 2007 e no ano seguinte ficou de fora por cirurgia no ombro. Com este currículo recheado de fatalidades, então surge um termo que marca a carreira profissional de Alex Smith: bust. Desta forma são chamados os jogadores que entram na NFL com grande expectativa e fracassam.

Fracasso... Até o início da temporada 2011-12 o tal rótulo perseguia Smith, com algumas verdades incluídas e pitadas de injustiça. Como aprender a jogar profissionalmente se a cada ano o coordenador ofensivo muda? Em 6 temporadas, Smith teve 6 coordenadores ofensivos diferentes. Justifica? Não. Mas ajuda a ilustrar um pouco da dificuldade, pois cada um destes treinadores tinha um sistema novo de jogadas, como uma forma diferente de chamá-las. Então vai lá aprender tudo de novo. Quando pegava a manha do playbook, o coordenador era demitido, outro chegava e o ciclo vicioso continuava.

Alex Smith, Antrel Rolle, Aaron Rodgers e Braylon Edwards

Numa leitura simples e pobre dos jogadores escolhidos no draft de 2005, alguns chegam a pífia conclusão que Smith não merecia ter sido o número 1. Não levam em conta o que aconteceu naquele ano e só usam a perspectiva de ver Aaron Rodgers, QB do Green Bay Packers, como o 24º escolhido e dizem: “Como podem ter deixado passar este talento?”.

Puf!

Mike Nolan, treinador dos 49ers em 2005, não queria escolher um QB. Até momentos antes do draft ele tentou trocar a escolha por um pacote de jogadores que ajudariam a compor o elenco. Não conseguiu vender esta ideia, ou melhor, o que ofereciam a ele era pouco. Decidiu, junto com Mike McCarthy, coordenador ofensivo (atual treinador dos Packers), escolher um QB. Hora de olhar as avaliações feitas com Smith e Rodgers para ver qual seria o número 1. Tanto Nolan quanto McCarthy estudaram muito ambos, dissecando os aspectos do jogo de cada. Nos prós e contras, a balança pesava a favor de Smith pelos detalhes mais intangíveis do que técnicos – e também era o jogador que mais agradava a diretoria. A escolha mais segura era Smith e se for falar que os 49ers erraram ao deixar Rodgers passar, é preciso dizer que McCarthy, homem que ajuda Rodgers a ser o excelente QB que é hoje, falhou também, assim como outros 19 times que não ficaram com A-Rod.

Essas características demonstradas fora de campo chamaram a atenção de Jim Harbaugh, atual treinador dos 49ers e que assumiu o time antes do lockout entrar em vigor. Jim conhece a posição, foi quarterback da NFL por 15 anos (Bears, Colts, Ravens e Chargers) e treinador de QB’s do Oakland Raiders por duas temporadas (2002 e 2003). Depois foi para a NCAA treinar o time de football da Universidade de San Diego (2004-2006) e a Universidade Stanford (2007-2010). Neste cargo anterior aos 49ers teve a oportunidade de treinar e moldar o jogo de Andrew Luck, QB considerado por especialistas como o melhor talento da posição na história da NCAA. Por mais que Smith ainda precisava acertar um novo contrato com a diretoria dos 49ers para a atual temporada, Jim entregou seu playbook para Smith dias antes do lockout começar. Um voto de confiança que Smith precisava.

Cansado de ouvir os gritos de Mike Singletary (ex-treinador dos 49ers, 2009-10) e as vaias da torcida, Smith considerava mudar. Mudar de cidade, de time. Quem sabe assim se livrar do estigma. Mas um treinador que foi quarterback fez com que ele considerasse ao menos um ano a mais com os 49ers. Mais uma chance de provar que é o número 1?

Não, agora não. Smith saiu da armadilha de provar algo pra alguém. Ele se concentrou a fazer o seu melhor e entregar em campo suas qualidades mais naturais sem forçar, sem querer impor uma superioridade inexistente. O querer tornou-se outro. O querer de ser Alex Smith.

Reuniu quantos jogadores conseguiu durante o lockout e fez treinamentos com eles na Universidade Estadual de San Diego. Com os companheiros de ataque passou a limpo o playbook que Jim o entregou. Soube ser líder sem alarde. Deu o exemplo.

O football voltou e Smith acertou contrato de um ano com San Francisco. Oportunidade para mostrar quem Smith é. Não o Smith que gostariam de ver. Preocupou-se menos com a opinião dos outros e mais com quem de fato é importante: consigo.


Assim, após querer o bem pra si mesmo, pôde querer o bem para o próximo. Smith precisava entender isto para poder render melhor em campo e tudo aconteceu numa conjuntura favorável: ótimo treinador aliado a experiência que o QB adquiriu ao longo destas 6 temporadas na NFL.

Smith tinha a mania de acompanhar seus números durante o andamento das partidas. Queria saber como estava seu desempenho estatístico visando uma boa imagem para os críticos de plantão. Agora nada disto, seu querer mudou. Não tenta mais forçar jogadas e seu jogo flui naturalmente. Entre os 20 QB’s com mais de 3.000 jardas aéreas na temporada regular que se encerrou no último domingo, Smith é o que tem o menor número de INT’s: 5.

A vontade de ser o melhor não morreu, está viva. Mas aplicada de maneira diferente do que fora feito. Com melhores resultados, entende-se que assim é como deve ser. Alex Smith não é melhor que Aaron Rodgers, quer dizer, há tantos outros QB’s melhores que Smith. Porém o camisa 11 dos 49ers está concentrado em fazer o seu melhor. Pode não ser suficiente para ser o grande destaque da sua área profissional, mas está num lugar mais satisfatório que antes.


(GL)
Escrito por João da Paz


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3 comentários:

Adrian Dallegrave disse...

Concordo que na época do draft escolher o Alex Smith antes do Rodgers não foi equivocado. Também acredito que esse ano ele está mostrando o motivo de ter sido o número um de toda classe de 2005. Porém, novas situações vão exigir que sua qualidade apareça nos momentos certos. Como ele vai se portar na primeira pós temporada? Em um possível primeiro Super Bowl? Acho que Alex Smith vai sentir a pressão e vai cair. Ele não é a solução de longo prazo pros 49ers.

Leonardo disse...

EXCELENTE post. Parabéns!

Ayres disse...

Gostei muito do texto, resume bem o que foi até agora a carreira de Alex Smith, que sem tantas expectativas, ainda pode vir a surpreender muita gente.

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