Tom Coughlin, o sobrevivente dos venenos destilados pela imprensa de New York


Uma pauta recorrente na mídia esportiva nova-iorquina, principalmente nos tablóides New York Post e New York Daily News, são os deboches direcionados à Tom Coughlin, treinador dos Giants, time de football mais popular da cidade. É assim desde que assumiu o comando, no melhor estilo da imprensa nacional quando o assunto é futebol e baixa produtividade de um determinado clube: demite o técnico!

Em New York a pressão por resultados positivos numa produção louca (agora, já, com qualidade e constância) é relativa ao visto nos veículos de comunicação paulistano ou carioca, por exemplo. Aquele grande time não pode perder, seja para um rival ou equipe de menor expressão, que começa o papo “demissão do professor”. Dentro da batida história que é mais fácil demitir um treinador do que dezenas de jogadores.

Coughlin chegou em NY vindo de um time pequeno de uma cidade pequena. Em 1995 ele assumiu as rédeas do novo time da NFL, o Jacksonville Jaguars. Seu trabalho lá pode ser considerado tão importante ao que conseguiu em NY, porque o saldo foi extremamente acima do esperado, um sinal de maravilha sobrenatural – talvez ninguém consiga perder apenas 2 jogos em 16 com os Jaguars, como Tom fez 1999; campanha que merece estudo à parte.

Com um time em expansão, na segunda temporada ele levou a franquia à final da Conferência Americana de 1996-97 – perdeu para o New England Patriots. Os Jaguars foram aos playoffs por mais três anos seguidos e na temporada 1999-00 chegou outra vez à final da AFC – perdeu para o Tennessee Titans. A partir de então a produção da equipe caiu, três temporadas seguidas com mais derrotas que vitórias, e após 6v-10d em 2002, Coughlin foi demitido.

Tom estava bem lá na Florida, sem pressão, tranquilo... Seu sucesso com o clube de Jacksonville criou uma expectativa surreal na franquia, como se fosse destinada a estar na elite da AFC. Nos 9 anos seguintes pós Coughlin, os Jaguars só tiveram 3 temporadas com aproveitamento acima dos 50% e uma vitoria nos playoffs.

Um ano de abstinência e em 2004 o NY Giants o chama. Sua primeira temporada com o time azul da cidade teve 6v-10d. Aí começou a cobrança da imprensa (lembrando que em 2003 os Giants venceram 4 jogos somente). Em situação similar ao que aconteceu recentemente com o QB do alviverde de NY, Mark Sanchez, jogadores dos Giants de forma anônima deram declarações ao New York Post de que eles não acreditavam no método antiquado de Coughlin (alicerçado numa liderança mais tradicional) e que muitos no elenco não jogariam para ele, faziam corpo mole para que o treinador fosse demitido. Isto tudo após derrota para seu ex-clube, os Jaguars, na semana 16, o oitavo resultado negativo seguido daquele campeonato.

A malhação da imprensa em Coughlin virou um esporte anual dos jornalistas locais, mas a estrutura dele estava sólida, pois tinha o apoio de quem importava, do dono. E o treinador não era muito de ouvir estas criticas (apesar de escutá-las). Sabe que para avançar é preciso não notar os maldizentes e transformar este mal em bem, em combustível desafiador para superar as adversidades. Mensagem transmitida aos seus jogadores que assimilaram esta ideia.

Os que se dirigiram a imprensa de forma anônima foram descobertos, ou saíram ou sofreram uma bronca pesada. Após a temporada de estreia veio uma sequência inédita na história da franquia fundada em 1925. Pela primeira vez os Giants se classificaram aos playoffs em quatro temporadas seguidas.

Em 2005 a reviravolta foi geral e a classificação para a pós temporada veio com 11v-5d. Mas a derrota para o Carolina Panthers na repescagem (23 a 0) fez voltar às manchetes a pauta “demissão do treinador”. Quem bateu forte na tecla foi o New York Daily News.


Em 2006 o time, na reta final do campeonato, perdeu dois jogos chaves em casa, um atrás do outro: para os Eagles na semana 15 e para os Saints na semana 16. Necessitava da vitória contra os Redskins na rodada final, jogo em Washington. Venceu e se classificou aos playoffs mesmo sendo 3º na Divisão Leste da NFC – perdeu para os Eagles na repescagem.

Aí novamente veio a conversa de demissão. Na verdade, qualquer derrota dos Giants era motivo para dispensa de Coughlin. Com tanta impregnação, parecia sina. O negativo na equação da imprensa nova-iorquina pesava mais que o positivo. Insistiam criar um clima para a saída do treinador, plantando notícias mentirosas de que jogadores estavam insatisfeitos com o trabalho de Coughlin, que eles não estavam jogando para o treinador, retomando o que fora abordado em outras oportunidades.

E chegou 2007.

Em casa os Giants não foram bem na temporada regular mas, pela primeira vez desde 2000, quando se classificou ao Super Bowl, que o clube venceu 6 partidas seguidas fora de casa. Ficou marcado por ter sido a equipe derrotada pelos Patriots na rodada final, fazendo a equipe de New England a única na história da NFL a vencer 16 jogos numa só temporada.

A boa perfomance fora de casa se manteve nos playoffs e os Giants, mesmo com 10v-6d, se classificou pela repescagem e venceu todos os jogos (3) longe de NY, conseguindo vaga no Super Bowl contra o... New England Patriots.

Era a chance dos Giants de impedir o título invicto do tricolor de Boston, vingar o resultado da semana 17 e vencer o Super Bowl após 27 anos. Assim foi.

"Demitir técnico? Quem inventou esta história?". Diria (se pudesse) a imprensa da cidade com um sorriso amarelo estampado na face...

Contudo se repetiu sim a conversa nos anos posteriores. Era perder um jogo qualquer e o burburinho começava a crescer. Lembrando que, após o primeiro campeonato do Coughlin em 2004, nenhuma outra temporada dos Giants terminou com mais derrotas do que vitórias.

O que não é suficiente para New York. Ganhou o Super Bowl? Tem de ganhar de novo, de preferência no ano seguinte. Cobrança persistente permaneceu a rodear o trabalho do treinador, que resistiu por ter um alicerce fortíssimo como mencionado anteriormente. Em 2011 esta base de sustentação foi testada numa série cômica de eventos.

A semana 10 começou com os Giants tendo 6v-2d. A semana 14 começou com os Giants tendo 6v-6 derrotas. Quatro reveses seguidos que, para muitos, era a gota d´agua, não dava mais. Vencer os Cowboys em Dallas foi um alivio momentâneo, visto que depois veio a derrota em casa para os Redskins. Nunca o assunto “demissão do treinador” foi tão forte em NY.

A imprensa, além de demitir Coughlin, dizia quem seria seu substituto. Os torcedores ecoavam este conceito jogado ao ar e a pressão só aumentava. Momento tenso no qual os jogadores decidiram fazer o que sempre faziam (mas agora com mais dedicação). Decidiram se entregar em campo para salvar o treinador, decidiram jogar por ele.


A equipe precisava de duas vitórias nos dois jogos restantes, todos em casa, contra os rivais Jets e Cowboys. Venceu ambos, ganhou o título da divisão e se classificou aos playoffs. Passou fácil pelo Atlanta Falcons e ganhou duros jogos fora de casa, contra os Packers em Green Bay e contra os 49ers em San Francisco. Classificação ao Super Bowl contra o... New England Patriots.

Agora querem que Coughlin cumpra seu ano de contrato que resta com o clube. Outros, pasmem, pedem renovação (!).

"Demitir técnico? Quem inventou esta história?". Diria (se pudesse) a imprensa da cidade com um sorriso amarelo estampado na face...


(GL)
Escrito por João da Paz


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