Que Venha o Amanhã


Com um pensamento de que tudo pode melhorar com o tempo, Doc Rivers, treinador do Boston Celtics, não se desesperou após seu time perder o jogo 3 das Finais da NBA, em casa, para o Los Angeles Lakers, ficando em desvantagem na série: 2 jogos a 1. Simplesmente porque da mesma forma que os Celtics venceram os Lakers em Los Angeles, o inverso poderia acontecer sem nenhuma surpresa.

Isto é basquete. Por isso que não devemos nos preocupar. Voltaremos ao centro de treinamento amanhã em preparação para a próxima partida... Essas coisas ocorrem com os melhores de nós” disse Rivers depois da derrota. Palavra direcionada a Ray Allen que teve uma péssima atuação, errando todos os 13 arremessos tentados após converter 8 arremessos da linha de três no jogo 2 – recorde em decisões.

Rivers tem a missão de renovar seu método aos seus comandados, aquele que expõe a confiança em si e nos companheiros independente das circunstâncias. Ele fez isto durante toda a temporada regular quando os críticos questionavam o poder de fogo do seu time, dizendo que uma equipe com aproveitamento de vitórias em torno de 50% não teria condições de vencer os primeiros colocados da Conferência Leste. Doc respondia com tranquilidade afirmando que tudo estava bem, o importante era ter todos seus principais jogadores saudáveis em Maio/Junho.

Cambaleando, os Celtics chegaram à pós-temporada e passaram pelos melhores jogadores da NBA. Ficaram para trás Dwyane Wade (Miami Heat), LeBron James (Cleveland Cavaliers) e Dwight Howard (Orlando Magic). Com o duelo perante Kobe Bryant (Los Angeles Lakers), Boston enfrentou nos playoffs quatro dos cinco jogadores do time ideal da temporada 2009-10 – o outro é Kevin Durant (Oklahoma City Thunder).

As super-estrelas foram um desafio a mais para o sistema defensivo dos Celtics, que além de parar o ataque adversário precisava impedir grandes atuações individuais de caras que podem mudar o rumo do jogo. Rivers teve seu plano executado muito bem e conseguiu chegar às Finais com um êxito difícil e relevante: tanto na série contra os Cavs quanto contra o Magic, duas das quatro vitórias foram fora de casa (em cada série).


Para levar o troféu Larry O´Brien de volta pra casa e relembrar 2008, os Celtics precisam vencer em Los Angeles. Restam quatro jogos – dois em cada cidade – e a meta para a equipe de Rivers é jogar contra os Lakers no Staples Center com um resultado favorável. Isto acontecerá se vencer os dois próximos jogos em Boston.

Doc maneja bem as adversidades e as encara da maneira correta. Ele busca entender o porquê para logo pensar no como reverter a situação. Não fica preso ao que já foi, mas se concentra no que poderá ser; é adepto do clichê um jogo de cada vez. Prefere gastar seu tempo nos treinos, aprimorando os acertos e concertando os erros ao invés de se prender em prognósticos e estatísticas.

Assim que os Lakers venceram o jogo 1, logo surgiu temeroso dado: Phil Jackson nunca perdeu uma série de playoffs (47 no total) quando vence a primeira partida. Se Rivers fosse entrar neste joguinho, poderia dizer que o Boston nunca perdeu uma série (7 no total) com este quinteto titular: Kendrick Perkins. Kevin Garnett, Paul Pierce, Ray Allen e Rajon Rondo. Poderia dizer também que os Celtics venceram 3 de 4 séries finais contra os Lakers após perder o primeiro jogo.

Ele não faz isto porque os números não são alvo de sua confiança. Vide o jogo 3 desta decisão. Nestes playoffs, Boston venceu 12 vezes e perdeu nenhum jogo quando o adversário marcou 95 ou menos pontos. Os Lakers venceram o terceiro confronto das Finais anotando 91 pontos...

Estudar o adversário e treinar as jogadas do seu livro são as prioridades de Rivers. Assim ele se tornou uma figura querida na organização e a confiança que ele deposita nos outros volta para si. O elenco sente isto em diversas ações que ele faz, como ter escondido um dinheiro no vestiário dos visitantes no Staples Center na temporada regular (passando a mensagem que eles voltariam para lá nas finais contra os Lakers e resgatariam o “investimento”), como ter invadido a quadra para pedir um tempo evitando que os Celtics estourassem a posse de bola na defesa (jogo 2 das Finais – vídeo abaixo)... Atitudes que encorajam seus subordinados e alegram seus superiores.



Talvez contagiado por esta onda de confiança, a diretoria da franquia aceitou a proposta do Chicago Bulls e negociou seu principal assistente, Tom Thibodeau, próximo treinador do tricolor após o término dos playoffs. A perda de Thibodeau, que era considerado o substituto natural de Rivers, pode ser um indício de que Doc voltará ao clube na próxima temporada, mesmo que sejam fortes os rumores de que ele ficará um ano de férias.

Jornais de Boston publicaram diversas matérias noticiando que Rivers estaria pensando seriamente em se abster por um ano e ficar mais próximo da família. O motivo maior seria acompanhar de perto a graduação de três de seus quatro filhos. Austin é um dos principais nomes do basquete americano no nível high school e ele vai para seu último ano na escola de ensino médio; Jeremiah vai entrar na temporada de veterano na equipe de basquete da Universidade de Indiana; e sua filha Callie encerrará uma brilhante carreira universitária na equipe de vôlei da faculdade Florida Gators. Rivers terá uma oportunidade única de acompanhar de perto a formação deles – relaxando em Orlando, onde reside.

Danny Ainge, diretor de basquete da franquia, ainda não conversou com Rivers a respeito de uma renovação ou se ele voltará na temporada que vem. O momento é de concentração e foco, tudo com o objetivo de conquistar mais um título para a galeria magnífica dos Celtics. Caso conquiste o campeonato, Rivers será apenas o terceiro treinador afro-americano a ganhar dois títulos da NBA – os outros são Bill Russel e KC Jones, ambos ganharam treinando o alviverde de Boston.

Tal feito será marcante para Rivers que aceitou com coragem o desafio de ajudar a reestruturar a franquia. Ao receber propostas para assumir o clube em 2004, diversos companheiros de trabalho ligaram para ele o aconselhando a recusar o convite. Diziam que seria muita pressão devido a grandeza da franquia e que o time era muito ruim, com poucos jogadores de qualidade para fazer uma revitalização. Rivers escolheu a opção mais difícil e aceitou a missão de ser o comandante da nova fase do Boston. Ele não ouviu os conselhos negativos e preferiu crer na positividade das suas ações e pensamentos. Independente de qual for o desfecho das Finais 2009-10, Doc Rivers já faz parte da rica história dos Celtics.

Ciente que o tempo trará consigo as repostas, ele se firmou na certeza de que a perseverança traz esperança e que a esperança não traz confusão.


[...]
Um passado de lutas e conquistas, desilusões, fracassos e sucessos
E dias e dias de sublimes realizações.
Do passado vem a lembrança, do futuro a perseverança.
Que venha o amanhã, afinal após tantos obstáculos enfrentados, somos cada vez mais fortes e aguerridos.

[...]
Vamos deixar para trás o que era provável
E no amanhã realizar o inacreditável
Vamos ser grandes seres de atitudes,
Ser mestres e realizadores de ideais
Almejar o pico mais alto.
[...]

Trechos da Crônica “Que Venha o Amanhã”
do cantor e compositor paranaense Carlos Pitty



(GL)


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