O que a ESPN americana ensina a folha.com; e a outros sites que cobram por conteúdo

Desde 21 de Junho deste ano, o site do jornal Folha de S. Paulo passou por remodelação, tentando se adaptar ao novo momento da mídia. Deixou de se chamar Folha.com, passou a ter o logo do jornal e implantou uma modalidade nova na imprensa online brasileira: cobrança por conteúdo. Apesar de uma prática difundida entre grandes nomes do jornalismo mundial, a Folha não está preparada para pôr em atividade o modelo chamado de paywall (“muro de cobrança”) e deveria olhar para a ESPN americana como exemplo, ao invés de se espelhar no New York Times.

O paywall da Folha funciona da seguinte maneira: o leitor tem acesso ao conteúdo completo do jornal (antes alguns textos eram restritos a assinantes), porém só pode ler 20 textos por mês. Após atingir esta cota, receberá um convite para preencher um cadastro, que lhe dará direito a outros 20 textos. A partir do 41º, o convite passa a ser para assinar o jornal e ler o site sem limites.

Vários erros são possíveis observar, a começar pela iniciativa e passar pelo trâmite do processo. O jornal diz que são 40 textos/mês livres ao usuário. Mas na verdade são 20, pois a outra metade não terá muitos adeptos pelo “simples” cadastro a ser feito. Nem os primeiros 20 devem ser utilizados realmente, visto que muitos leitores não irão voltar a visitar o site justamente por saber que terão uma parede logo a frente para bloqueá-los.

Um fato dito por Sérgio Dávila, editor executivo da Folha, é que o leitor geral não sentirá esta restrição.  Quem lê mais de 20 textos por mês no site? Porém só o funcionamento desse método afastou os leitores.

Sérgio justifica a ação da Folha dizendo que o jornalismo de qualidade custa caro, por isso quer angariar mais assinantes para bancar o conteúdo do jornal. Quem responde melhor este tópico é a ombudsman da Folha, Suzana Singer, responsável por avaliar o comportamento do jornal e de suas iniciativas:

Para ler pequenos informes sobre o que aconteceu nas últimas horas, em textos mal-ajambrados, ou para saber das fofocas mais recentes sobre celebridades do 'mundo B', ninguém precisa gastar um centavo, há uma oferta enorme de sites e blogs gratuitos na rede".

A Folha se compara ao New York Times, jornal americano que cobra por conteúdo. Entretanto são realidades totalmente diferentes (e conteúdos diferentes, diga-se). Uma coisa é o NYT criar o tal “muro de cobrança”, outra coisa é a Folha querer o mesmo.

No NYT você não vê manchetes deste naipe: "Gretchen toca sino de 'A Fazenda' e pode deixar programa".

O diretor executivo do jornal paulistano se sustenta na boa receptividade que os leitores do NYT tiveram com o paywall, aumentando o número de assinantes online – e com um detalhe, reduzindo o limite de textos gratuitos de 20 para 10. Mas esqueceu de pontuar um aspecto importante, a resposta para a pergunta: Por que existe o paywall?

O New York Times está no limbo como tantos outros jornais do mundo, tendo queda no número de vendas em bancas, acarretando uma gravidade, que é o declínio da publicidade impressa. No último bimestre de 2011, o lucro do NYT caiu 12%, puxado pela queda das propagandas no jornal impresso (8%). Isto contribuiu para que a perda do NYT em 2011 fosse de US$ 40 milhões.

Apostar no paywall para cobrir o rombo que o jornal impresso presenteia não é a melhor estratégia para a o NYT (muito menos para a Folha). Ao invés disto, a estratégia tem de ser outra, apostar num conteúdo gratuito online que seja diferencial do impresso, gerando mais leitores de página única e assim atraindo mais patrocinadores.

O jornalismo de qualidade entra em cena agora.

E o exemplo melhor disto é o que a ESPN americana faz.

O canal de esportes via TV por assinatura tem uma vantagem, visto que arrecada muito através da venda individual que tem nos EUA – o canal é vendido separadamente pelas operadoras, num custo em volta dos 5 dólares, o canal mais caro (de longe) das TVs por assinatura.

Nesta brincadeira se ganha um bom dinheiro.

Mas a plataforma digital é outra mina de ouro que a ESPN explora com eficiência e chama a atenção o que ela faz gratuitamente. Antes, vale ressaltar, que eles tem um espaço para assinante, chamado de “insider”, lugar com conteúdo exclusivo onde as análises de comentaristas/especialistas são os destaques – e não a notícia.

Isto impede que um futuro "muro" impeça que um internauta, em meio a um momento de notícia urgente (breaking news), encontre uma indesejada mensagem-convite ao procurar o desdobramento do assunto mais quente em questão. Risco que correm os jornais adeptos do paywall em notícias.

A ESPN fez de seu site um portal esportivo completo de informações e notícias. Conforme medição em Maio deste ano, realizada pela comScore Media Metrix, foi o terceiro site esportivo mais visitados por americanos, atrás da FOX/MSN e Yahoo. 

O site espn.com traz conteúdo diferente do que é visto na TV e em rádios pertencentes ao grupo. Assim, quem é assinante do canal e/ou ouvinte sabe que no site irá encontrar matérias exclusivas. Abrange um maior público, que pode ser leitor do site e não telespectador ou ouvinte. Como se fossem veículos independentes.

Ou seja, a atração do site da ESPN não é o que a Folha prega para que você “atravesse o muro da cobrança” e leia o conteúdo completo do jornal impresso.

Um modelo deste trabalho primoroso da ESPN é o realizado com o programa “Outside  The Lines”, grife da emissora que só perde para o Sportscenter em importância. O OTL é um programa investigativo e de debates sobre assuntos “além das linhas” de jogo. Somente ia pro ar aos domingos de manhã, mas ganhou uma versão diária pela tarde e transmissão via rádio também.

No site o trabalho é magnífico e as matérias publicadas são diferentes das edições diárias ou semanais do OTL na TV. Clique nos links abaixo e observe:




Note a extensão do texto, o trabalho gráfico, as fotos, a qualidade da informação... Tudo isso de graça, sem custo algum para o internauta.

A ESPN aposta nisto para gerar tráfego, page views e atrair patrocinadores – arrecadando dinheiro para fazer um jornalismo de qualidade.

Esta é a melhor estratégia.


(GL)
Escrito por João da Paz

Nenhum comentário:

Postar um comentário