Desintegrando um caráter em 140 caracteres


Você conhece Johnny Manziel?

Bem, antes de tudo é bom definir o que é conhecer alguém.

Pelas facilidades que a tecnologia nos proporciona, conversar com uma pessoa por meios eletrônicos, quaisquer que sejam, é comum. O que não significa que seja normal. Essas mesmas bugigangas nos aproxima de celebridades e a exposição nos deixa ainda mais próximos dos famosos, principalmente os que não utilizam com cuidado as novas ferramentas de comunicação.

Aí entra Johnny Manziel.

Manziel, 20 anos, quarterback da Universidade Texas A&M, é atualmente pessoa mais popular do football universitário, alguns argumentam que figure nos padrões de Vince Young (Texas) e Tim Tebow (Florida), dois dos jogadores mais populares da história da NCAA. Manziel começará a temporada de segundanista, mesmo estando três anos na faculdade. Até o ano passado ele era somente um novato desconhecido, até brilhar em um dos momentos mais impactantes do campeonato de 2012.

Venceu a Universidade Alabama em território inimigo, então time rankeado em primeiro lugar. Atuação que fez a luz brilhar em si e Manziel soube responder com qualidade em campo, registrando números impactantes que o levaram a ganhar o Troféu Heisman, dado ao melhor jogador da NCAA.

Uma pergunta surgia: quem é esse tal de Manziel?

A imprensa não tinha muito para mostrar, pois uma regra da faculdade o impedia de conceder entrevistas. Mas a temporada acabou e tudo mudou.

Manziel começou seu tour pela Famocidade no programa de entrevistas do David Letterman. Logo veio uma conta no Twitter e ao entrar na rede social, tão usada pelos jovens, ele passava a traçar um caminho perigoso que pode levá-lo a um fim nada agradável.

Sua rotina passou a ser compartilhada por milhares. Através de cada tweet, construído em até 140 toques em um teclado, Manziel florescia sua personalidade, dividia com estranhos opiniões pessoais e passava a documentar diversos fatos do seu cotidiano. São tantos tweets reveladores que não é exagero dizer que quem o segue pode ser considerado um conhecido de Manziel.

Claro, o jogador não é a única pessoa que se expõe demais no Twitter, muito menos está na classe dos que se expõe de forma exagerada. Contudo a temporada passada o rendeu um status que não condiz com o que ele espalha na rede social.

Encontros com grandes nomes do esporte americano, com cantores importantes do cenário musical e tantos outros instantes de entretenimento estão catalogados em sua conta. Isso não é tão grave, lógico. Mas fotos em bares (muitos bares) e um estilo de vida exibido nos retratos postados online, é uma marca nociva para uma pessoa como Manziel.

Que não é uma pessoa X.

Nem vive num mundo igual a maioria.

Sua liberdade é cerceada pelo bom senso, assim não pode dizer o que bem entender. Certa vez ele postou que não podia esperar para deixar a faculdade. O desconforto criado por tão poucas palavras foi danoso para Manziel, contribuindo para desgastar sua imagem, que está em processo de ser aniquilada. Johnny Football, como também é conhecido, apagou a mensagem de sua conta, mas, evidentemente, não restaurou o que havia sido arranhado.

Ele conversa muito com os fãs pelo Twitter, interação que pode ser um crédito, desde que bem usada. Essa abertura do diálogo é a brecha que desconhecidos usam para tentar se tornar um chegado de Manziel. Intimidade extremamente perigosa e que causou seu episódio negativo mais recente.

Manziel largou um treinamento de quarterbacks organizado pela família Manning (pai Archie e filhos Peyton e Eli). Saiu porque perdeu a hora dormindo, consequentemente não comparecendo num evento pela manhã de um sábado. Boatos, apenas boatos, contam que ele festejou bastante na sexta anterior e a ressaca venceu. Os Mannings entraram num acordo amigável com Manziel e o deixou ir pra casa.

O QB deu sua versão no Media Day da sua conferência na NCAA (SEC), programa que aconteceu nessa semana. Manziel depositou na conta do cansaço a soneca que o fez perder tal evento, dizendo que estava muito desgastado devido os compromissos (?) da baixa temporada. Não contabilizou um tweet que o deletou na noite do mesmo sábado.

Sim, Manziel foi para sua casa na cidade de College Station, Texas, mas à noite esteve em um bar. O usuário da conta @Chaz_Cake informou a todos: “E aí? Johnny Manziel está no Hookah Station”. Mensagem apagada depois, mas nada da internet desaparece facilmente.

Agora, é muito errado tirar uma onda num barzinho, tomar umas, outras e todas? Não é para isso que serve a faculdade? E o direito de divertir-se?

Veja, nada há de errado numa descontração, só que não são todos que podem exagerar na farra. Muito menos se gabar por aí na net.

É um cuidado extra que Manizel deve tomar, até por ter passagens na polícia, por não ter se identificado a um oficial da lei após uma briga perto de um bar próximo ao campus da faculdade.

Sabe quem está de olho em tudo isso? Os scouts da NFL. Quando Manziel recebeu o Troféu Heisman, surgiram as óbvias projeções para a NFL e naturais comparações com QBs famosos. Pela sua altura, na liga atual, ele lembra Russell Wilson ou Drew Bress, contudo seu estilo de jogo é mais similar ao de Doug Flutie. Embora os detalhes técnicos são deixados de lado quando o comportamento extra campo sobrepõe a atenção.

As entrevistas de Manizel no Media Day da SEC mais lhe prejudicou do que ajudou. Entre suas declarações e justificativas estavam: “Sou jovem e vou continuar a viver ao máximo”. “Não vou mudar”, “Tenho 20 anos e faço o que garotos da minha idade que estão na faculdade fazem”. Essas são frases estúpidas, como se erros de outros justificassem os equívocos dele. E soam mais como arrogância do que entendimento do seu papel hoje em todo o país, para o esporte, para a sua universidade e para o seu time.

Nada disso ecoa bem para os executivos da NFL. Homens que procuram outros homens para liderar franquias, ser exemplo carregando o símbolo do clube.

Moleques de vinte e poucos anos que desperdiçam oportunidades, conquistam apenas o descrédito da principal liga esportiva do mundo. Atuar nela, como gosta de dizer o comissário Roger Goodell, é um direito, não um dever.

Caso o sonho de Manziel seja arremessar uma bola oval aos domingos, terá de se policiar, compreender que vive num mundo diferente dos demais. Terá também de decifrar a diferença entre o que é comum e o que é normal.


(GL)
Escrito por João da Paz
© 1 Scott Halleran / Getty Images

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