Noite de 13 de Abril de 2012. Data marcada para ser terror na vida de Ozzie Guillén, treinador do Miami Marlins, time da MLB representante do estado da Flórida. Foi o primeiro jogo em casa após a polêmica declaração do venezuelano sobre Fidel Castro, dada à revista Time:
“Eu adoro Fidel Castro. Eu respeito ele. Sabe por quê? Um monte de gente quis matá-lo nos últimos 60 anos, mas aquele filho da **** está ainda aqui”.
Certo ou errado, a opinião de Guillén gerou indignação na população cubana-americana que habita na cidade de Miami. A publicação da entrevista saiu no começo da semana, porém a discussão sobre o teor dela rendeu e se esperava protestos ao redor do Marlins Park na última sexta.
Não aconteceu nada de grande proporção.
Entretanto uma pessoa compareceu para mostrar descontentamento e seu gesto é simbólico e ajuda a entender esse cenário.
Lazaro Diaz é como se chama o homem que dirigiu por 3 horas até chegar ao estádio dos Marlins. Levou o filho representando a terceira geração da família. O avô do garoto penou nas mãos do regime ditatorial de Fidel Castro. Dois tios de Lázaro foram executados pela revolução cubana. Do lado de fora do Marlins Park, ele disse:
“Vim até aqui para expressar que sou contra ele [Guillén] e que o clube deveria demiti-lo. Ele tem todo direito de desfrutar da liberdade de expressão, mas não deveria ter feito uma declaração infeliz, especialmente pelo que ele [Fidel Castro] fez com nossa comunidade [cubanos-americanos]”.
Diferente do ventilado em muitos veículos, existe sim liberdade de expressão nos Estados Unidos e ela está muito bem, obrigado. Se o governo interviesse contra Guillén, isto é cerceamento da liberdade, mas quando uma entidade privada, que tem relação direta com o agente da polêmica, a história é outra.
Guillén está na primeira temporada em Miami – antes estava com os White Sox de Chicago. Lá, inclusive, demonstrou carinho por Fidel. Detalhe: era outra cidade, outro clube.
Em Miami é diferente. O alvo dos Marlins é atrair a comunidade latina da cidade. A principal contratação para o campeonato de 2012 foi um dominicano (José Reyes) e Guillén chegou justamente para reforçar esta ligação. O estádio do clube fica num bairro chamado “Pequena Havana” – Havana é a capital de Cuba.
As lojas do clube vendem camisas do treinador e a saída da peça é alta. Este simples exemplo mostra a representatividade e popularidade de Guillén. Qual clube esportivo consegue comercializar uma camisa do técnico?
Ozzie veio para somar, acabou dividindo o público do clube e multiplicando um furor que tem fundamento lógico de quem sofre/sofreu com o regime político de Fidel Castro.
Um empregado (ou colaborador, na nova linguagem de hoje) dos Marlins em hipótese alguma poderia dizer algo do tipo, pois vai contra o que a franquia quer. A punição dada a Guillén foi pouca – multa e fora de ação por cinco jogos –, deveria ter sido maior pelo estrago criado e do que potencialmente pode acontecer.
A comunidade cubana-americana e latina ensaiou um protesto para a sexta feira 13. Não houve manifestação massiva, porém algo além da fala de Lazaro aconteceu: o estádio ficou vazio no jogo contra o Houston Astros. Permanecendo isto a longo prazo, tende a ser um desastre para o clube. O Marlins Park, que estreou nesta temporada, custou US$ 515 milhões (com US$ 160 milhões de impostos). Da franquia saiu US$ 355 milhões, verba planejada para ser recuperada com público próximo da capacidade total (36 mil pessoas). Mas se o protesto consistir em não comparecer ao estádio...
E se deixarem de comprar os produtos licenciados dos Marlins?
O lado ferido pela declaração de Guillén o quer fora do clube. Sem mais.
Para alguns de nós é difícil entender, contudo é extremamente forte e dolorosa a frase de Guillén. Os cubanos-americanos, grande parte de forma direta, padeceram com Fidel Castro. Alguns tiveram parentes mortos em Cuba, alguns perderam entes queridos no caminho à Flórida via Oceano Atlântico, alguns têm familiares em Cuba que sofrem represálias por ter um membro morando nos EUA...
Não há como compreender isto sem usar a compaixão.
O esporte tem um papel influente tão profundo que causa fortes emoções. O contexto no qual Guillén vive dificultou a situação. Mas, como disse aos seus jogadores na pré-temporada, quem errar é preciso admitir ao invés de omitir.
Guillén assim fez, pediu desculpa e foi contrito.
Não resolveu muito, embora se expôs para amenizar o dano.
Nos Estados Unidos outras celebridades mostraram admiração por Fidel em diversas formas, porém não dentro de um ambiente latino.
Bud Selig (comissário da MLB) organizou um jogo em Cuba em 1999 e sentou ao lado de Fidel.
Distintas situações.
Não houve exagero na reação dos cubanos-americanos e latinos contra Guillén. Pedir demissão dele também não está fora da realidade. Conforme os dias passam, a raiva pode diminuir, mas não irá desaparecer.
Tudo isto por uma declaração? Sim, porque não foi uma declaração qualquer. Ter liberdade de expressão traz no kit a responsabilidade pelo o que é dito. Quem vive numa democracia é livre pra fazer o que bem entender, só que neste regime também existem leis e regras – quem as ferir é punido.
Como dito anteriormente, ninguém do governo americano ou de qualquer esfera política repreendeu Guillén por dizer que admira Fidel Castro, assim como não há punição a quem criticar Barack Obama, presidente dos EUA. A liberdade de expressão que existe é constitucional.
Em ambientes empresariais a ordem é outra. O colaborador que falar mal da empresa vai ser punido de acordo com a gravidade da situação. É assim em qualquer organização séria. Os Marlins puniram Guillén mais como resposta ao caos criado, visto que a repreensão não corresponde ao equívoco cometido.
“Eu adoro Fidel Castro. Eu respeito ele. Sabe por quê? Um monte de gente quis matá-lo nos últimos 60 anos, mas aquele filho da **** está ainda aqui”.
Certo ou errado, a opinião de Guillén gerou indignação na população cubana-americana que habita na cidade de Miami. A publicação da entrevista saiu no começo da semana, porém a discussão sobre o teor dela rendeu e se esperava protestos ao redor do Marlins Park na última sexta.
Não aconteceu nada de grande proporção.
Entretanto uma pessoa compareceu para mostrar descontentamento e seu gesto é simbólico e ajuda a entender esse cenário.
Lazaro Diaz é como se chama o homem que dirigiu por 3 horas até chegar ao estádio dos Marlins. Levou o filho representando a terceira geração da família. O avô do garoto penou nas mãos do regime ditatorial de Fidel Castro. Dois tios de Lázaro foram executados pela revolução cubana. Do lado de fora do Marlins Park, ele disse:
“Vim até aqui para expressar que sou contra ele [Guillén] e que o clube deveria demiti-lo. Ele tem todo direito de desfrutar da liberdade de expressão, mas não deveria ter feito uma declaração infeliz, especialmente pelo que ele [Fidel Castro] fez com nossa comunidade [cubanos-americanos]”.
Diferente do ventilado em muitos veículos, existe sim liberdade de expressão nos Estados Unidos e ela está muito bem, obrigado. Se o governo interviesse contra Guillén, isto é cerceamento da liberdade, mas quando uma entidade privada, que tem relação direta com o agente da polêmica, a história é outra.
Guillén está na primeira temporada em Miami – antes estava com os White Sox de Chicago. Lá, inclusive, demonstrou carinho por Fidel. Detalhe: era outra cidade, outro clube.
Em Miami é diferente. O alvo dos Marlins é atrair a comunidade latina da cidade. A principal contratação para o campeonato de 2012 foi um dominicano (José Reyes) e Guillén chegou justamente para reforçar esta ligação. O estádio do clube fica num bairro chamado “Pequena Havana” – Havana é a capital de Cuba.
As lojas do clube vendem camisas do treinador e a saída da peça é alta. Este simples exemplo mostra a representatividade e popularidade de Guillén. Qual clube esportivo consegue comercializar uma camisa do técnico?
Ozzie veio para somar, acabou dividindo o público do clube e multiplicando um furor que tem fundamento lógico de quem sofre/sofreu com o regime político de Fidel Castro.
Um empregado (ou colaborador, na nova linguagem de hoje) dos Marlins em hipótese alguma poderia dizer algo do tipo, pois vai contra o que a franquia quer. A punição dada a Guillén foi pouca – multa e fora de ação por cinco jogos –, deveria ter sido maior pelo estrago criado e do que potencialmente pode acontecer.
A comunidade cubana-americana e latina ensaiou um protesto para a sexta feira 13. Não houve manifestação massiva, porém algo além da fala de Lazaro aconteceu: o estádio ficou vazio no jogo contra o Houston Astros. Permanecendo isto a longo prazo, tende a ser um desastre para o clube. O Marlins Park, que estreou nesta temporada, custou US$ 515 milhões (com US$ 160 milhões de impostos). Da franquia saiu US$ 355 milhões, verba planejada para ser recuperada com público próximo da capacidade total (36 mil pessoas). Mas se o protesto consistir em não comparecer ao estádio...
E se deixarem de comprar os produtos licenciados dos Marlins?
O lado ferido pela declaração de Guillén o quer fora do clube. Sem mais.
Para alguns de nós é difícil entender, contudo é extremamente forte e dolorosa a frase de Guillén. Os cubanos-americanos, grande parte de forma direta, padeceram com Fidel Castro. Alguns tiveram parentes mortos em Cuba, alguns perderam entes queridos no caminho à Flórida via Oceano Atlântico, alguns têm familiares em Cuba que sofrem represálias por ter um membro morando nos EUA...
Não há como compreender isto sem usar a compaixão.
O esporte tem um papel influente tão profundo que causa fortes emoções. O contexto no qual Guillén vive dificultou a situação. Mas, como disse aos seus jogadores na pré-temporada, quem errar é preciso admitir ao invés de omitir.
Guillén assim fez, pediu desculpa e foi contrito.
Não resolveu muito, embora se expôs para amenizar o dano.
Nos Estados Unidos outras celebridades mostraram admiração por Fidel em diversas formas, porém não dentro de um ambiente latino.
Bud Selig (comissário da MLB) organizou um jogo em Cuba em 1999 e sentou ao lado de Fidel.
Distintas situações.
Não houve exagero na reação dos cubanos-americanos e latinos contra Guillén. Pedir demissão dele também não está fora da realidade. Conforme os dias passam, a raiva pode diminuir, mas não irá desaparecer.
Tudo isto por uma declaração? Sim, porque não foi uma declaração qualquer. Ter liberdade de expressão traz no kit a responsabilidade pelo o que é dito. Quem vive numa democracia é livre pra fazer o que bem entender, só que neste regime também existem leis e regras – quem as ferir é punido.
Como dito anteriormente, ninguém do governo americano ou de qualquer esfera política repreendeu Guillén por dizer que admira Fidel Castro, assim como não há punição a quem criticar Barack Obama, presidente dos EUA. A liberdade de expressão que existe é constitucional.
Em ambientes empresariais a ordem é outra. O colaborador que falar mal da empresa vai ser punido de acordo com a gravidade da situação. É assim em qualquer organização séria. Os Marlins puniram Guillén mais como resposta ao caos criado, visto que a repreensão não corresponde ao equívoco cometido.
(GL)
Escrito por João da Paz
Escrito por João da Paz
© 1 Ike Ehrmann / Getty Images
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