Jackie Robinson, o fim da segregação racial e as semelhanças com a aceitação homossexual


Estreia o filme “42”, nos Estados Unidos, que conta a história de Jackie Robinson, primeiro jogador afro-americano a atuar num time da MLB (Major League Baseball). Seu primeiro jogo foi no dia 15 de Abril de 1947 e neste domingo 14, como comumente acontece, todos os atletas da liga usarão o número 42 em sua homenagem. Lembrança da barreira que foi estraçalhada com sua contratação, 600 dólares por mês, pelo então Brooklyn Dodgers.

A segregação racial nos EUA vigorava em sua deplorável plenitude. Os negros tinham que sentar nos bancos de trás dos ônibus, dormir em hotéis separados de brancos, comer em restaurantes somente em lugares reservados. Mas, por exemplo, eles podiam servir as forças armadas da nação. Logo uma voz ecoava: se morrem em guerras e lutam pela bandeira americana, por que não participar do passatempo yankee?

O tradicionalismo misturado com um conservadorismo forte fazia a situação não ser tão simples. Similar posição que se nota em 2013 com a expectativa de jogadores dos esportes americanos assumirem serem gays e permanecerem jogando. Esse assunto foi tratado aqui no grandes ligas no texto “Aspectos sociológicos acerca de jogador gay na NFL”.

Jackie Robinson não era um nome qualquer escolhido entre mais de 100 para ser o pioneiro numa árdua luta que deixou muitos mortos e feridos. A batalha homossexual se iguala na questão do direito individual e erradicação da intolerância. Para tanto, os jogadores gays que assumirem sua sexualidades – se espera que na NFL sejam quatro atletas – tenham uma reputação esportiva acima da média, sejam carismáticos com o público e de franquias exemplares, para assim poder segurar o provável ataque inconsequente que receberão.

Branch Rickey era o diretor de beisebol do Brooklyn Dodgers, cargo que assumiu em 1943. Rickey gozava de um sucesso ímpar no esporte: quatro títulos da World Series como GM do Saint Louis Cardinals (1926, 32, 34 e 42). Um ano após o quarto troféu foi para New York com a missão de construir um time campeão. Com isso em mente ele arquitetou um plano de montar o melhor elenco de jogadores. Olhar as chamadas Negro Leagues era crucial, pois lá o talento brotava.

Os negros tinham sua liga própria porque eram proibidos de jogar beisebol desde 1884 (imagina...). O primeiro comissário da MLB, Kennesaw Mountain Landis (1920-1944) era oposto a integração de negros no beisebol profissional. Diversos artigos de jornais da época confirmam isso, mas em alguns dos seus discursos ele desconversava, jogando a responsabilidade nos donos das franquias. Fato é que nem Landis nem os diretores faziam qualquer esforço para contratar afro-americanos.

Até Branch Rickey entrar em cena.

Rickey, papel interpretado por Harrison Ford no filme “42”, assumiu os Dodgers uma temporada depois do segundo comissário passar a gerir a MLB: Happy Chandler (1945-1951). Um político influente, Chandler vinha de uma sequência importante na carreira, sendo governador do estado de Kentucky (1935-39) e senador (1939-45). De pensamento esquerdista, membro do Partido Democrata, ele era voz ecoante a favor de leis trabalhistas em prol dos operários. Sua participação no caso Robinson foi fundamental.

Em seu primeiro ano como comissário Rickey assinou Robinson para ser membro do time de base localizado em Montreal, Canadá. Era um teste para todos. Por uma temporada o diretor dos Dodgers conversava com Chandler sobre Robinson jogar na MLB. Rickey falava maravilhas do atleta formado na UCLA e com um talento especial apresentado em quatro esportes: football, basquete, beisebol e atletismo (salto em distância). Militar, Robinson era um homem preparado, educado e pronto para encarar o desafio enorme que viria ao seu encontro. Jogar beisebol seria o menor dos problemas.

Rickey fez uma peneira nas Negros Leagues. O afunilamento era resultado da busca por alguém com uma habilidade em campo excelente e com mente suficiente centrada para administrar a pressão de ser o primeiro negro na MLB.


Confiante que Robinson era o cara, Rickey assinou o “vultoso” contrato e Chandler aprovou. Robinson representou, segurou a onda em campo e levou pra casa o prêmio de novato do ano. Mas fora dele, como infelizmente era de se esperar, os ataques racistas eram constantes.

Os torcedores esbravejam impropérios da mais baixa ordem. Até aí era complicado de se fazer algo. Agora quando os ataques partiam de dentro da MLB, Chandler assumia a responsabilidade e defendia Robinson com intensidade. Em 1947 ele precisou se impor duas vezes, uma contra o Philadelphia Phillies (seu então treinador, Ben Chapman xingava Robinson explicitamente), e outra contra os Cardinals (os jogadores do clube ameaçavam não jogar contra os Dodgers com Robinson em campo; Chandler informou que quem fizesse isso seria suspenso indefinidamente).

Robinson defendeu os Dodgers por 10 temporadas. Seis vezes participou do Jogo das Estrelas, MVP em 1947 e campeão da World Series em 1955. Sua qualidade estupenda facilitou e conforme os anos foram passando as pessoas olhavam para ele sem notar a cor da pele. Os ignorantes comentários racistas continuaram, contudo Robinson manteve-se firme e não respondia com ira. Mesmo atuando na MLB tinha situações, principalmente na Região Sul dos EUA, que era obrigado a sentar na parte de trás dos ônibus, a sair de aviões expulsos por brancos... Numa sociedade completamente dividida pela questão racial, Robinson foi um personagem primordial no rompimento desse tabu.

Existem jogadores gays nos esportes americanos, evidentemente. Entretanto esses não assumem devido a fatores que não estão sob controle próprio. Os que tomarem coragem irão enfrentar revoltas. Daí a preparação cuidadosa para a revelação que logo será divulgada. Os jogadores são da elite, com pessoas ao redor aptas a defendê-los incondicionalmente, seja para organizar uma marcha ou movimento; seja para criar um ambiente sem estardalhaço.

Quem não teve a oportunidade de acompanhar a carreira de Robinson, ou saber de sua história, terá a oportunidade de conhecê-la através do filme “42”. Embora neste momento estamos vivendo um “filme”, acompanhando a história se desenrolar. E anos mais tarde ela será retratada num roteiro hollywoodiano com as pitadas de realismo que observamos decorrer bem na nossa frente.

É a queda de mais um estúpido muro.



(GL)
Escrito por João da Paz
© 1 por The Roosevelts

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